Criar música eletrônica pode ser um exercício técnico, mas para Reishi é, antes de tudo, um gesto de permanência. Por trás do projeto criado em 2023 está Gustavo Condé, DJ e produtor com mais de duas décadas de vivência na cena house/techno, que acabou encontrando no psytrance o território ideal para unir imaginação, narrativa e experiência sensorial.
Inspirado pelo cogumelo da imortalidade, pela ficção científica e por universos que transitam entre o espiritual e o futurista, o artista constrói faixas que não se limitam à função de fazer dançar – elas propõem jornadas.
Nesta entrevista, Gustavo fala sobre processo criativo, identidade sonora, os contrastes entre psytrance e techno, e como transformou ideias abstratas sobre inteligência artificial em música.
Fale um pouco sobre a escolha do nome do seu projeto, o Reishi. O que fez você escolher exatamente este cogumelo?
Reishi: Eu gostei do nome e da intenção. Reishi é o cogumelo da imortalidade. Além disso, depois de conhecê-lo através de um documentário, começaram a comercializar o extrato para fins medicinais. Quero que a minha música seja imortal, como ele.
Quais são as principais inspirações (sonoras, visuais ou espirituais) que te guiam na criação do som do Reishi?
Reishi: Minhas inspirações vêm em momentos específicos. Confesso que muitas são “do nada”, quando estou assistindo a alguma série ou filme, principalmente. Eu sempre tô fazendo uma música, trabalhando em algum projeto… Isso é um hábito na minha vida há mais de dez anos.
Existe uma linha conceitual ou narrativa que conecta suas produções, ou cada faixa nasce de uma energia diferente?
Reishi: Existe sim uma linha que conecta minhas produções. Vem das minhas referências, do tipo de som que eu gosto de ouvir e também desse meu lado inspirado pela ficção científica e pelos universos que imagino quando estou criando. Mas cada faixa acaba nascendo com uma energia própria.
No começo, nem sempre sei exatamente qual vai ser essa energia. Ela vai aparecendo aos poucos, conforme eu mergulho no processo dentro do estúdio.
Tendo vivido os dois mundos (o do psy e o do house/techno), como você enxerga as diferenças entre eles na hora de criar uma faixa?
Reishi: No psytrance. o processo é bem mais complexo. Eu uso muito mais canais, mais camadas e mais detalhes ao mesmo tempo. No house/techno, eu trabalhava com mais simplicidade e groove. São formas bem diferentes de criar.
Produzir música envolve tanto técnica quanto sensibilidade. Seja em encontrar uma identidade sonora, traduzir uma ideia em som ou lidar com as limitações técnicas e criativas do estúdio, quais são, pra você, os principais desafios nesse processo?
Reishi: Hoje em dia, meu maior desafio não é técnico. Isso eu já domino bem, até dou aula de produção no Logic. O que mais pega pra mim é a criatividade. É aquela vontade de criar algo que realmente me surpreenda, do mesmo jeito que eu me surpreendia na pista anos atrás ouvindo Astrix ou Wrecked Machines. Encontrar essa faísca, essa ideia que te dá arrepio… Esse é o ponto mais difícil do processo.
Explique um pouco o processo criativo nas construções dos EPs “Artificial Intelligence” – seu último lançamento – e “Shanti”, de abril.
Reishi: “Shanti” representa o início do meu sonho com o Reishi. As faixas foram criadas bem no começo do projeto, num momento que eu estava cheio de empolgação e vontade de finalmente produzir psytrance depois de anos desejando isso. Na época, eu ainda trabalhava num MacBook Pro de 2011, que eu guardo até hoje porque tem um valor sentimental enorme. Foi nele que aprendi sozinho a fazer música eletrônica, e ele marcou o início de tudo.
Eu tinha poucos recursos na criação das faixas, e eu sei que a régua do psytrance sempre foi muito alta, tanto em produção quanto em equipamentos. Mesmo assim, esse EP foi um processo de realização pessoal. Eu fiz com o que tinha e fiquei muito feliz com o resultado.
Já no “Artificial Intelligence”, existe um salto claro de qualidade. Agora eu tenho um estúdio muito melhor, monitores regulados, uma interface de áudio moderna… E isso naturalmente se reflete no som.
Além da evolução técnica, eu já estava com uma linha criativa mais definida, explorando o tema da inteligência artificial e toda a atmosfera que envolve essa discussão. Foi um processo mais maduro, tanto criativo quanto tecnicamente.
O EP “Artificial Intelligence” nasceu da ideia de que vivemos em uma realidade simulada por uma IA. Como essa teoria se transformou em música dentro do seu processo criativo? Quais foram os desafios de produção para dar forma sonora a ideias tão abstratas e conceituais?
Reishi: Eu acho que o psytrance é um som muito moderno. Eu sempre falei que é som do futuro, de 2050 [risos]. E quando eu ouço, em alguma série ou documentário, algum vocal sobre o tema de inteligência artificial, naturalmente eu relaciono esses dois mundos. Acho que aconteceu de forma não intencional, muito por eu achar que esses dois temas conversam.
Quais são as próximas novidades do projeto?
Reishi: Eu passei por uma fase de pouca criatividade nos últimos meses. Continuei produzindo, mas senti que tive um bloqueio, e acho normal, porque nem sempre a gente está a todo vapor.
Tenho algumas faixas já no processo de masterização, então em breve terei lançamentos. E confesso que estou muito feliz, porque desde que fiz a minha primeira música eu sabia que a qualidade ia chegar no nível que eu queria lá pela vigésima track. E agora estou vendo isso acontecer.







