Afro House: Das raízes africanas à reinvenção brasileira, a história do estilo que conquistou o mundo da música eletrônica.

Enquanto o Apartheid se aproximava de seu fim na África do Sul, o House e o Techno, estilos que surgiram de populacões afro-americanas nos Estados Unidos, tomavam as pistas da Europa. Com a chegada de novos ares na África do Sul, uma nova vertente da House Music foi abraçada e desenvolvida pelo país.

A inclusão de elementos e características locais como o uso intenso da percussão, o ritmo suave da sua base e, em alguns casos, vocais cantados nos dialetos das regiões, foram implementados a House Music pela primeira vez ainda nos anos 80, pouco após seu surgimento. No entanto, somente na década seguinte o Afro House nasceu, tornando-se uma forte manifestação moderna da cultura do continente. 

Tendo como um de seus principais expoentes o DJ Black Coffee, o Afro House logo inspirou artistas de países como Quênia e Angola, absorvendo referências culturais de cada um desses locais. No início dos anos 2000, o estilo se expandiu para a Europa, sendo disseminado pelos clubes Berlim e Londres, dando origem a um movimento que interessou não só as pistas, mas também outros produtores. 

Na segunda década do século XXI, o estilo começou a se consolidar pelas pistas ao redor do mundo. Em 2013, a plataforma Traxsource criou uma categoria dedicada ao Afro House, o que também foi implementado pelo Beatport em 2017. 

No entanto, o estilo surpreendeu em meados de 2020, quando começou a se destacar internacionalmente como um dos mais relevantes da música eletrônica. A variante da House Music passou a ser protagonista em grandes festivais, sendo tocada por nomes como David Guetta, Tiësto e Diplo. 

Nomes como Shimza, da África do Sul, e Nitefreak, do Zimbábue, se tornaram referências na cena, e o estilo foi absorvido por produtores do mundo inteiro como Francis Mercier, do Haiti, o coletivo alemão Keinemusik, e os brasileiros Curol, Maz, Antdot e Kiko Franco. 

O Afro House no Brasil

Um dos responsáveis pela introdução e disseminação do gênero no país, o DJ angolano radicado no Rio de Janeiro, Joss Dee, conquistou o público local produzindo festas regadas a Afro House, Kuduro e Amapiano, mas devidamente influenciado pela sonoridade brasileira, em especial, o Funk carioca, a MPB, e o Pagode.

O passar dos anos e o processo natural de amadurecimento dos produtores locais, marcaram o início de uma transição do estilo, deixando o lado Underground para trás em busca de um lugar de destaque no Mainstream. Os primeiros indícios dessa mudança e sua inserção cada vez maior na música eletrônica brasileira, surgiram ainda em meados de 2019, ano no qual a dupla Drunky Daniels despontou com seu álbum “Zabumba” na parada da Traxsource. Dois anos mais tarde, o remix para “Love Tonight” dos australianos do Shouse, levou Vintage Culture e Kiko Franco ao topo do chart Afro do Beatport, feito, até então inédito, entre produtores brasileiros.

Porém, foi com uma nova geração de talentos que o jogo mudou por completo, estabelecendo o Brasil como uma das referências mundiais do estilo originário do continente africano. Enquanto por um lado, a sonoridade estivesse fadada a cair em uma armadilha causada pelo comodismo e o sucesso fácil, foi na cultura brasileira e toda a sua riqueza musical, que nossos produtores viram uma forma de inovar e conquistar um lugar ao sol com uma mistura única. 

Um exemplo é Carolina Ribeiro, mais conhecida como Curol, com personalidade e muito talento, ganhou notoriedade ao unir sonoridades do Afro House a elementos do Progressive e do Tech House, originando faixas emblemáticas como “Oxum”. 

O resultado? Um convite para acompanhar Black Coffee durante sua turnê pelo Brasil, e posteriormente, uma apresentação em Tulum, no México, ao lado do coletivo de DJs e produtores alemães do Keinemusik, além da gravação de um set memorável para um dos episódios do Keinemusik Radio Show.

Entretanto, a consolidação do Afro House brasileiro veio com a dupla Maz e Antdot. Ao se tornaram os artistas mais vendidos do gênero no mundo, os rapazes foram responsáveis por faixas icônicas como “Banho de Folhas”, “Povoada”, “Todo Homem” e “Corpo e Canção”, fazendo uso de uma fórmula exata entre a essência dos ritmos africanos e a musicalidade intrínseca na cultura local.

Donos do set mais assistido no Youtube da edição 2023 do Tomorrowland Brasil, idealizadores da Dawn Patrol – um dos selos mais importantes do estilo na atualidade – Maz e Antdot conquistaram recentemente com seus últimos singles lançados, mais uma vez, o topo do chart Afro House da Beatport, com destaque para “Amana”, esta uma parceria de Maz e VXsion, cravando seu lugar na história ao tornar-se a primeira faixa 100% brasileira, a alcançar o topo do chart overall do site.

Subvertente que mais cresceu no último ano, segundo relatório do IMS – instituto que analisa anualmente o panorama da música eletrônica mundial – o Afro House atravessou fronteiras, superou preconceitos, deixou de lado o seu caráter underground e politizado, incorporando elementos de outras sonoridades, tornando-se sinônimo de sucesso e influência para DJs e produtores que desejam trazer frescor e modernidade às suas produções, mas sem esquecer as origens e tradições das matrizes do povo africano.

Vida longa ao Afro House.