Não é de hoje que as tendências movem, desde os benefícios financeiros ao entretenimento, o cenário eletro-musical como um todo. Ainda que seja um tema extremamente subestimado por grande parte do público, já passou da hora de ser abordado com mais frequência por quem está no olho do furacão ou, mais precisamente em outras palavras, por quem vive da música eletrônica.
Portanto, recentemente houve um exemplo que deve ser visto, de uma maneira específica, com bons olhos pelo cenário brasileiro. Um dos maiores – senão o maior – produtores de música eletrônica do mundo e notavelmente conhecido por ser uma máquina de hits, Calvin Harris surpreendeu ao apostar em um novo projeto paralelo denominado como “Love Regenerator”, com músicas em um estilo mais retrô, fazendo alusão aos anos de ouro da Dance Music.
“Eu queria redescobrir o jeito que originalmente comecei a produzir música 22 anos atrás, antes de sequer pensar como seria percebida pelos outros. Apenas por pura diversão e experimentação com o que parecia bom para mim”. Comentou Calvin Harris em entrevista à BBC
Com sons inspirados pelas antigas raves, breaks, Techno e House — música pela qual o artista afirmou ser obcecado quando garoto, o projeto é feito para que os sons soem como se tivessem vindo de uma cápsula do ano de 1991.
Ademais, acima de tudo, é algo feito para dar prazer primeiro ao artista e, depois, para o público em geral. E esse é o principal ponto que deve ser levado em consideração.
“Eu estou agora somente no negócio — e estive nele nos últimos quatro anos — de criar música que faz eu me sentir bem. Na esperança que faça outras pessoas se sentirem tão bem quanto, ou pelo menos apenas um pouquinho tão bem quanto, e melhore o seu dia”. Concluiu Calvin Harris em entrevista à BBC
É verdade que Calvin Harris é um dos DJs e produtores mais versáteis do mundo, além de ser extremamente bem sucedido, o que leva a crer que não há mais necessidade de criar singles visando o lucro monetário em primeiro lugar.
De qualquer modo, deve ser visto como modelo por quem almeja estar entre os melhores produtores eletro-musicais do mundo e, de alguma maneira, busca aliar gosto pessoal com profissionalismo.
Sendo assim, quando o principal produtor musical do cenário, que está no topo da pirâmide, reflete sobre a escolha de um estilo pelo qual produz, tudo indica que existem problemas ainda maiores envolvendo quem não sabe nem qual caminho seguir.
Atualmente no Brasil, por exemplo, há mais seguidores de tendência do que propriamente estilos musicais. Afinal, é o que faz sucesso e consequentemente leva ao êxito financeiro. Mas será que vale a pena abdicar de produzir o que realmente gosta para agradar ao público?
De maneira negativa, a pobreza de espírito do público brasileiro acaba influenciando no foco que o produtor local precisa rumar no respectivo estilo musical.
Na maioria dos casos, o apego às produções pouco atraentes e com relativa baixa qualidade afeta diretamente na alternância de elaborar sons diversificados.
No pensamento geral, o argumento de “time que está ganhando não se mexe” é a base do encadeamento musical, visto que é muito mais lógico seguir a linha do que sair da curva.
Ousar, ser criativo e fazer aquilo que faz bem ao artista deveriam ser as premissas básicas para ingressar na profissão. Com isso, o psicológico também é influenciado positivamente, visto que é um dos maiores problemas envolvendo a dura rotina de alternar entre horas em estúdios, performances e viagens com maior frequência. Parece clichê, mas não é: a boa e velha fala de que “fazer o que gosta” vale da mesma forma para a produção eletro-musical.
Resumidamente: os produtores brasileiros seguem a cartilha de serem, notavelmente, mais seguidores do que criadores de tendências. Até há a existência do contra-argumento de um determinado retoque de funk, desande ou linhas retas.
Mesmo assim, é muito pouco para uma região tomada por produtores com potencial para chegar à níveis internacionais, como os casos de Eric Prydz, David Guetta, Deadmau5, Armin van Buuren e Skrillex. Todos são artistas consagrados que usam projetos paralelos para instigar a criatividade sem interferir no som requisitado pelo público.
No geral, a música precisa passar uma mensagem do que é pretendido ser transmitido e uma história de quem está produzindo. Isto posto, ainda que criar rótulos sobre a produção eletro-musical seja mais prejudicial do que benéfico, é preciso que exista a fundamentação de um estilo próprio visando a autenticidade do projeto como um todo.
Logo, paradigmas e estereótipos, enraizados na cultura da música eletrônica no Brasil, precisam ser quebrados por quem está propriamente dentro da mesma. No caso, os responsáveis por produzir, ouvir ou vender música – sem exceções – possuem papel fundamental na não rotulação para influenciar, de uma vez por todas, no avanço do cenário nacional brasileiro.