Como forma de me apresentar a vocês, um disclaimer: há aqui um fã incontestável dos álbuns musicais, aqueles que há uma década e meia eram físicos e disputados nas saudosas e queridas lojas de discos e que hoje são disponibilizados nas plataformas de streaming. Eu achava muito foda abrir um CD, olhar a capa, folhear e entender cada música, admirar a arte emprega. Pô, era lindo!
Mais do que isso, saber que um artista compôs um álbum era entender que esse sujeito despendeu meses e meses, muito trabalho e dedicação para criar algo autoral, com sua cara, com seu jeito, com seu talento todo. Era um ato pouco comercial, mas muito edificante e significativo. Na minha cabeça, era como receber uma cartinha escrita à mão livre e com dedicatória para mim.
Quando eu tinha 3 aninhos, o Daft Punk lançou o ‘Homework’ (1997), mas eu só fui conhecê-lo quando debutei na adolescência. Uma experiência transformadora, não me resta qualquer dúvida. Era mágico viajar com os caras em uma sequência de sonoridades incomuns e que faziam enorme sentido quando juntas. Foi meu batismo para adorar essas produções. Te digo que nunca mais parei.
Já mais velhinho, mas apegado à história, passei a colecionar alguns daqueles que me soavam ser lendários. Quando consegui acessar o Kraftwerk – Computer World (1981), meus amigos, que momento lindo. Pô, imaginar que há fucking 40 anos alguém era capaz de pensar tão tão tão adiante e já trabalhar com aquele nível de novidade… fascinante. Depois vieram composições formidáveis como Skrillex – Bangarang EP (2011) e Deadmau5 – 4×4=12 (2011).
Ainda que Mau5 e Skrillex tenham me assombrado pela novidade e pela genialidade, o meu álbum predileto da vida pertence a Sir Pierre David Guetta, o extraordinário ‘Nothing But The Beat’ (2011). E que ano lindo foi 2011, aliás. Ele é o meu grail por conta da ainda incomum possibilidade de ser pertencente à cena eletrônica e ser popular ao ponto de invadir as rádios, tal qual um fenômeno teen.
Até então era muito incomum que a gente, que ama esse som, estivesse visível para além das fronteiras. Éramos nós por nós e pronto. Guetta trouxe uma onda totalmente democrática, fazendo parcerias com ícones de outros gêneros, com estrelas do pop e com quem mais fosse possível. Não demorou para o álbum se tornar um blockbuster e entrar para a história como um abre-alas ao futuro.
Exatamente uma década depois do golden-year, o cenário é muito diferente. Há uma selvagem disputa de lançamentos semanais, sempre às sextas, nunca como álbum. Os EPs têm certa relevância, mas a real é que pouca gente para e produz um novo trabalho, com cuidado, carinho e atenção devidos. Cada vez menos, gravadoras e empresas fonográficas abrem caminhos para um hiato alongado pensando num grande release. É tudo novo, toda hora.
Minha grande questão é: realmente são coisas novas? realmente existem novidades? Te mostro um exemplo chamado KSHMR. Ele parou, sim. Ficou algum tempo sem grandes lançamentos e surgiu com um álbum novinho em folha, composições diferentes e que dialogam entre si, contando uma grande história – que ilustra seus shows pelo mundo. Identidade visual e musical muito particulares. Tudo isso vindo de um sujeito da primeira prateleira global da cena. Ou seja, basta querer.
Guardo ainda um minutinho para lembrar de brasileiros que ousaram. Os meninos do Breaking Beattz, por exemplo. Um álbum bonito, autoral, com a cara deles, com identidade, colaborações nacionais e regionais, com tudo aquilo que eles têm direito. Fizeram da pandemia uma abertura para darem a voadora no lustre e colocarem no mercado um cartaz 100% deles. Isso é foda.
Antes de acabar esse papo, que já está longo, te coloco um trio para discutirmos sobre: Swedish House Mafia. Um unicórnio da cena. Um hit global. Um álbum, de 2012. A crítica da época ainda apontava que parecia um grande compilado daquilo que eles já tocavam como trio e em carreiras solo. Uma década depois, entre idas e vindas, eles compuseram 45 novas músicas e, enfim, vão dar uma porrada na porta e ditar rumos, novamente.
Criar álbuns é criar história. É assumir riscos e colher relevância. A pandemia deu tempo aos produtores, que puderam ir aos estúdios. O tempo não se esquece das grandes produções, ainda que os produtores nem sempre busquem a história. É preciso olhar com mais amor à base da fonografia, que são os álbuns, os grandes CDs. Eles se tornam turnês, DVDs, números bilionários e assumem um lugarzinho no coração de quem ouve. Oxalá um dia eles sejam tão praticados como outrora.